10 vozes LGBTQIAP+ que estão reescrevendo o metal nacional
Escrevo este texto com a esperança de que em breve ele se torne obsoleto – e até cause um certo constrangimento ao jovem que, por acaso, o encontrar nos arquivos da internet no futuro.
Que ele provoque aquela conhecida “vergonha alheia”, sinal de que teremos, enfim, alcançado o óbvio: gênero e sexualidade não deveriam ter de ser justificados, mas simplesmente reconhecidos como partes naturais da identidade humana – tratadas com o respeito que toda pessoa merece. Mas hoje esse trabalho é necessário, então, vamos a ele.
No metal, artistas LGBTQIAP+ ainda enfrentam intolerância, desconfiança, piadas e violência, em um cenário que, curiosamente, veja bem, prega o antissistema. Mesmo assim, cada vez mais vozes dissidentes ocupam o palco.
Do glam rock dos anos 70 – onde homens podiam brincar com o feminino (mas mulheres não e isso dá outro texto!) – ao punk e ao riot grrrl dos anos 90, que deram vez às lésbicas, a luta por reconhecimento é antiga.
Agora, uma nova geração está à frente dessas trincheiras e dão forma a essa lista do TMDQA! de 10 vozes LGBTQIAP+ que estão reescrevendo o metal nacional. Confira!
10 vozes LGBTQIAP+ que estão reescrevendo o metal nacional
Marc Brito (Hellway Train e Creatures)

Marc Brito é vocalista das bandas Hellway Train e Creatures. Mineiro, enfrenta o preconceito desde que se assumiu gay há 15 anos – foi rejeitado por amigos, agredido e disseram que sua banda perderia espaço por ter “um viado”.
Sua presença no palco é política: shorts curto, acessórios de couro e atitude provocadora. “O som é bom, mas esse shortinho não dá”, são falas que ainda surgem pelo caminho. Um de seus ídolos é Rob Halford (Judas Priest), que também é gay. Inegavelmente as raízes vocais do brasileiro vem da escola Metal God de ser e suas bandas agradam e muito os fãs do Priest.
“Quando eu conheci o Halford, eu nem sabia que ele era gay. Na verdade, eu nem sabia que eu era gay”, conta. Foi só depois que tudo começou a fazer sentido. As letras intensas de músicas como “Beyond the Realms of Death” e “Here Comes the Tears” ganharam novo peso. “Tem coisa que eu nem consigo escutar”, se emociona Marc.
Com o Hellway Train, lançou “Pride Is a Riot”, referência à revolta de Stonewall. Com o Creatures, fez recentemente uma versão pesada para “Perfect Illusion” de Lady Gaga.
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Haru Cage (Corja!)

Haru Cage, vocalista da banda cearense Corja!, é uma das vozes mais potentes do metal nacional da nova geração e sua versatilidade em várias frentes já a colocou em vários outros momentos aqui do TMDQA!, como na lista de bandas lideradas por mulheres que você precisa conhecer.
Como mulher lésbica no metal, destaca-se ao empunhar a bandeira do orgulho nos palcos. Ela revela que era vista quase como “um cara”, o que facilitava o respeito, refletindo as dinâmicas disfuncionais de gênero na cena fortalecida pelo machismo. Aponta ainda que homens gays enfrentam mais discriminação, devido a um machismo que associa proximidade com a homossexualidade à fragilidade masculina.
“Existia uma ilusão sobre a minha figura de que eu era como “um brother”, algo mais perto da masculinidade, e por isso o respeito vinha mais rápido”, conta a esta coluna do TMDQA!.
Haru contou que assumir-se na cena musical foi motivado pelo relato de mulheres que se viam representadas por ela, percebendo que sua individualidade na verdade representava um posicionamento coletivo.
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Anna C. Chaos (Umbilichaos)

Anna C. Chaos é vocalista do projeto solo Umbilichaos, que mistura doom e post-hardcore. Mulher trans, ela traz sua identidade para a música, explorando temas como solidão e dor. Seu álbum “Filled by Empty Spaces” foi produzido por ela mesma, utilizando drum-machine e afinações adaptadas.
Anna encontra apoio em espaços progressistas como coletivos para enfrentar a transfobia, segundo relata em entrevistas. Ela acredita que o rock ainda carrega uma agressividade machista, tornando-se um ambiente inseguro para a comunidade LGBTQIAP+.
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Vini Castellari (Project46)

Vini Castellari é guitarrista da banda Project46, um dos principais nomes do metal moderno brasileiro, com origem em São Paulo. Gay, Vini tem se destacado como uma das vozes mais potentes na discussão sobre gênero e sexualidade dentro da música pesada, utilizando seu espaço para desmistificar preconceitos ainda presentes na cena.
Sua revelação como homem gay surpreendeu muitos, tanto pelo conservadorismo quanto por sua chamada passabilidade hétero – ou seja, por se encaixar visualmente no estereótipo do “menino hétero”, o que fazia com que poucos suspeitassem de sua orientação.
Com bom humor e criatividade, passou a usar o termo “gay-tarrista” para referir a si mesmo, muitas vezes compartilhando nas redes sociais aspectos de sua vida afetiva com leveza e naturalidade. Hoje, Vini talvez seja o nome mais em evidência no debate sobre orgulho LGBTQIAP+ no metal brasileiro, sendo parte de uma banda já consolidada na cena.
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Rohh Krammer Schroder (Nephall)

O pernambucano Rohh Krammer Schroder é vocalista da banda Nephall, de death metal/deathcore com viés filosófico e anticlerical. Gay, Rohh leva à cena underground uma presença poderosa e política, rompendo estereótipos com sua estética agressiva e vocal extremo – gutural, brutal e com pinceladas de pig squeal.
Na bio do Instagram, exibe a bandeira LGBTQIAP+ e o símbolo do “urso”, subcultura que celebra homens gays mais robustos, peludos e masculinos. Com sua postura confrontativa, Rohh transforma o palco em espaço de resistência no metal extremo.
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Amanda Paim (Agravo)

Amanda Paim (ao centro na foto) é vocalista e guitarrista da Agravo, jovem power trio de garotas de São Paulo que une punk, hardcore e metal. Lésbica e dis-fem – ou seja, fora dos padrões tradicionais de feminilidade – ela vê sua presença na cena como um ato político.
“Me declarar é uma forma de dar força a outras pessoas LGBT na música pesada. O preconceito existe, e a resistência é necessária”, falou à coluna.
Amanda também aponta que a presença de lésbicas é muitas vezes aceita apenas sob um viés de fetiche:
“Mulheres dis-fem, como eu, enfrentam mais resistência. Somos desvalorizadas ou confrontadas por não seguir um padrão.”
Além da música, a banda participa de festivais ligados ao feminismo, racismo e veganismo e outras causas sociais, fazendo do som um instrumento de luta.
Melissa Maia (Dirty Grave)

Melissa Maia é vocalista da banda mineira Dirty Grave e uma mulher trans que se destaca na cena doom/heavy metal com vocais intensos, presença marcante e um visual poderoso. Mais que música, Melissa usa suas redes sociais para reafirmar sua identidade e ampliar a representatividade trans no underground.
Além do Dirty Grave, ela integra outros projetos relevantes como Mães Morrendo, Enxofre e também mantém um trabalho solo sob o nome Melissa, voltado ao “slow heavy metal” — cujo primeiro álbum foi lançado também em fita cassete, reforçando o apego ao underground clássico.
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Föxx Salema (Solo)

Föxx Salema é uma artista solo de São Paulo, natural de Bragança Paulista, e uma das pioneiras trans no heavy metal brasileiro. Com vocal potente, que transita entre a energia clássica do metal tradicional e a intensidade melódica do power metal, Föxx une música, performance e ativismo.
Suas composições trazem letras engajadas, múltiplas influências e um lirismo progressista, explorando vivências pessoais, sociais e políticas. Com estética old school nos materiais, Föxx é referência LGBTQIAP+ no metal nacional, ampliando espaços e quebrando barreiras com autenticidade.
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Midorii Kido (Solo)
Midorii Kido é uma drag queen da Bahia criada pelo multiartista Ygor Amaral. Existir como drag já é resistência e certamente no metal é um duplo desafio. Kido é vocalista e performer, unindo o peso do metal à identidade drag, com uma presença cênica e gutural de respeito!
Sua discografia inclui os EPs A Caixa de Pandora (2018) e aMALdiçoado Seja (2019), além dos singles Sic Mundus Creatus Est (2020) e Corpo Fechado (2021). As músicas abordam temas intensos como dor, vícios, autoconhecimento e renascimento.
Midorii acaba de lançar “Stone Wall“, um single com clipe duro, corajoso e necessário. A faixa presta homenagem ao levante de Stonewall, episódio que deu origem à data do Orgulho (28 de junho), e traz um alerta de gatilho: o vídeo retrata uma cena de agressão contra um homem gay – incômoda, como o metal deve ser, e coerente com a crítica urgente que a música pesada é capaz de carregar.
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Karina Aschmedai (Praga)

Karina Aschmedai é vocalista e guitarrista da banda carioca de black metal Praga e uma mulher trans. Após iniciar sua transição já adulta, foi acolhida pelos colegas de banda, que reafirmaram seu lugar no grupo. Na biografia do Instagram, informa ser “travesti em construção”.
Além do Praga, Karina toca em outras bandas e defende uma mudança de mentalidade no underground, resgatando o espírito original do rock’n’roll como um espaço para quem vive à margem. “Não devemos temer a mudança, pois o conservadorismo nos leva a um caminho perigoso”, afirmou ao portal Lucifer Rex.
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Isis Correia