TMDQA! Entrevista: Scalene e a celebração especial do renascimento

Fotos por Yvã Santos

A cena do rock nacional sempre teve seus altos e baixos, mas poucas bandas conseguem se reinventar e se manter relevantes como o Scalene. Conhecido por sua sonoridade intensa e letras profundas, o grupo está de volta aos holofotes para uma celebração muito especial.

Em um reencontro com seus fãs e com a própria essência, o Scalene retornou para celebrar o emblemático álbum Éter, um marco em sua discografia que ressoa até hoje com o público. Mas as novidades não pararam por aí: além de uma apresentação esgotada no Cine Joia que marcou o início de uma turnê especial, junto com a celebração, a banda apresentou recentemente o single “Quimera”, mostrando que o futuro apresenta um leque de possibilidades.

Nesta entrevista exclusiva para o TMDQA!, mergulhamos no universo do Scalene para conversar sobre essa fase de renascimento, a importância de Éter em suas carreiras e os detalhes da nova música que já está dando o que falar. Gustavo e Tomás Bertoni nos convidaram a conhecermos os bastidores desse retorno e as reflexões de uma banda que continua a desafiar os limites do rock brasileiro.

Vem com a gente!

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TMDQA! Entrevista Scalene

TMDQA!: Fala galera! Enorme prazer em conversar com vocês, ainda mais de forma tão ativa. A turnê de 10 anos de Éter começou e irá levar a banda por diversas cidades. Qual
a sensação de revisitar um álbum tão marcante depois de uma década e ver a
resposta do público a essa celebração?

Tomás: Quando iniciamos a pausa não havia plano exato de quanto tempo duraria e como voltaríamos. Fim do ano passado começamos a pensar no retorno e nos tocamos que ia fazer 10 anos do Éter, então partimos disso. Tem sido interessante porque é uma forma de nos reconectarmos e ressignificarmos o ano de 2015 que foi muito marcante pra nós e para boa parte dos fãs. Foi um ano de grande exposição que mudou completamente nossas vidas. Não tocávamos maior parte desse álbum há muito tempo, experiência legal com a cabeça de hoje tocar essas músicas.

TMDQA!: Ter um disco tão importante quanto o Éter na carreira é obviamente um motivo de orgulho. Recolocar o rock em rádios e TVs, ganhar um Grammy Latino… Vocês
fizeram história. Como vocês percebem a evolução do significado e do impacto
desse álbum, tanto para a banda quanto para os fãs, ao longo desses dez anos?

Tomás: Essa é a primeira vez que estou olhando para um álbum nosso com uma ênfase
maior que os outros, sempre olhei pro conjunto da obra. Então admito que ainda estou
absorvendo sem pressa as percepções e entendendo, principalmente via os fãs, esse
significado e impacto. O carinho que a galera tem por esse álbum está sendo muito
gratificante, estou empolgado pra continuar os shows de comemoração.

Gustavo: Pois é, é difícil enxergar o todo quando se está no meio do furacão e foi um ano
bem intenso – esse tipo de coisa é um belíssimo lembrete da força das canções, como ela
marca as pessoas e resiste ao tempo… Dez anos nem é tanta coisa assim, mas em tempos
onde mercado, consumo e comportamento mudam freneticamente, atropelando conexões e afetos, fico muito feliz de fazer parte da história dessa galera que tem colado nos shows.

TMDQA!: Caras, aliás, “Quimera” acabou de chegar ao mundo e é simplesmente uma
viagem. Gustavo mencionou que a faixa nasceu da energia de revisitar o passado
no comunicado de imprensa, e é realmente impressionante como a música traz essa
pitada nostálgica. Como foi o processo de “retrabalhar” esse esqueleto e o que fez
com que ele se encaixasse tão perfeitamente neste momento de celebração e
retomada da banda?

Gustavo: Acho que a gente não queria apontar para um lugar novo sonoramente, nem se
comprometer com isso. Queríamos injetar ainda mais ânimo e algum grau de ineditismo
nessa retomada do Éter, então procurei nos HDs velhos algumas demos do disco que não
foram pra frente – e essa tinha um belo refrão, com a base meio riffada, algo não tão comum pros nossos refrões. Outras partes pareciam ser o início das nossas explorações em coisas mais brazucas como se vê em magnetite (2017). Na nossa cabeça ela tinha a energia que o primeiro show da turnê entregou, além de dar espaço pra colocar alguns elementos do LABIRINTO (2022) como sintetizadores e timbres mais soturnos. Foi divertido, e na real, é a primeira produção 100% assinada por nós mesmos!

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TMDQA!: A letra de “Quimera” é bastante introspectiva e crítica em alguns pontos. Além da composição impactante, é importante reiterar que “quimera” pode ser uma criatura
mitológica ou algo que surgiu de distintos elementos. Poderiam falar um pouco sobre
a inspiração por trás dessas passagens? Ainda mais com uma trajetória de tantas
glórias e momentos nos anos passados.

Tomás: “Éter” é um conceito criado na Grécia Antiga e tem várias “versões” ao longo do
tempo. Seria algo como o “quinto elemento”, o elemento que rege os outros quatro, que compõe o céu e corpos celestes, que viabiliza a propagação da luz. “Quimera” vem da mitologia grega também então há essa conexão. Sobre o significado da letra, desde o LABIRINTO não temos falado mais muito diretamente sobre o significado das músicas,
especialmente logo que elas saem. Tira um pouco o espaço pra cada ouvinte fazer a própria interpretação.

TMDQA!: Vocês descreveram a faixa da seguinte forma: “vai bem no nosso âmago ali do
post-hardcore, perpassa pelas brasilidades do ‘Magnetite’ e soa meio soturna como
o ‘Labirinto’”. Como vocês conseguiram integrar tantos elementos de diferentes
fases da banda em uma única canção, e o que isso diz sobre a sonoridade atual da
Scalene?

Gustavo: Meio que acabei respondendo um pouco sobre antes [risos] acho que não diz muito sobre a atual ou futura sonoridade nossa, mas acaba reforçando nossa versatilidade e curiosidade por diferentes gêneros e constante busca de trazer elementos interessantes pro post-hc que é nossa maior escola. Um amigo brinca que é identidade é, também, insistência. E depois de tantos anos compondo juntos é gostoso sentir que qualquer coisa que a gente fizer vai ter nossa cara.

TMDQA!: Desde “Real/Surreal” até “Labirinto”, a discografia da Scalene é rica e
diversificada. Olhando para trás, como vocês avaliam a jornada da banda e quais
foram os principais aprendizados e desafios que moldaram a Scalene que estamos
vendo renascer em tanto estilo?

Tomás: Uma constante pro Scalene é estar sempre explorando, acontece de forma natural
conforme evoluímos como artistas e seres humanos – conforme vamos conhecendo novos
artistas que nos influenciam e até conforme o mundo muda. Nos deixamos levar e tentamos racionalizar apenas o suficiente pra estarmos alinhados. Privilégio ter tanta gente que nos acompanha e aprecia esse processo.

Gustavo: Quem tem banda desde a adolescência com seus amigos sabe como é visceral.
Scalene foi e é veículo, claraboia, espelho, nóia, argamassa, armadilha, fetiche, âncora…
tudo que se pode imaginar pro nosso desenvolvimento como pessoas. E o Éter foi nosso
rito de passagem, em vários graus. De assuntos burocráticos a questões artísticas, foi com
a banda e entre nós que aprendemos a se colocar no mundo. Entre triunfos e erros, tenho
um orgulho e gratidão imensa. Percebo a gente, talvez, no melhor astral entre nós que já
tivemos. Isso pra mim não tem preço.

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TMDQA!: A banda teve um hiato entre 2022 e 2024. Como esse período de pausa impactou a perspectiva de vocês sobre a música, a dinâmica do grupo e a decisão de retornar de forma tão expressiva?

Tomás: Pessoalmente, um dos pontos principais foi desvencilhar dentro do possível de
percepções e expectativas externas – seja do mercado, seja do público. Foram anos muito
intensos, principalmente entre 2015 e 2022. Não tínhamos muito tempo pra absorver tudo
que acontecia e essa pausa foi importante pra nos entendermos como pessoas, não
necessariamente vinculadas ao Scalene.
Sobre a dinâmica do grupo, concordo com o Gustavo, estamos no melhor astral entre nós. O Maick é um ser maravilhoso e um dos melhores bateristas do Brasil, sem nenhuma dúvida – bom demais ter ele conosco! E nossa equipe mais direta do dia-a-dia, as meninas da Soligirls no design, o Igão e Danilinho na produção, tem sido maravilhosa.

TMDQA!: Considerando a evolução da cena do rock brasileiro, como a Scalene enxerga seu papel e legado nesse cenário, especialmente depois de terem sido uma referência
na música contemporânea nacional?

Tomás: Nós fizemos bastante pela “cena” ao longo dos anos. Tivemos parcerias muito
legais em lançamentos, nós sempre que possível colocávamos bandas pra abrirem nossos
shows, nós produzimos muitos eventos, eu fazia um festival grande em Brasília e
genuinamente nos importávamos com essa “fomentação” e fortalecimento do mercado
independente e do “meiostream” como um todo, não só de um gênero específico.
Honestamente foi ficando claro que infelizmente muitas das pessoas que colavam com a
gente tinham um interesse não muito construtivo. Extraiam mais do que somavam. Tenho
muito carinho por quem jogou junto esses anos e fico feliz que não tenho mais
ressentimento por quem se “aproveitou”. E zero nos colocando como grandes altruístas,
tínhamos uma visão e mentalidade de que nos fortalecia fortalecer a “cena”. Acho que só
éramos um pouco ingênuos que todo mundo pensaria de forma parecida.
Agora é retomar e entender como podemos continuar contribuindo, mas vou lembrar que
primeiro você coloca a máscara de oxigênio em você mesmo, depois você ajuda os outros.
No show do mês passado no Cine Joia, tivemos o Jovelina com a gente, e agora a galera do
Daparte vai tocar em Juiz de Fora e Rio de Janeiro conosco também. Essa parceria e troca
na estrada é uma das partes mais legais da vida artística.

TMDQA!: “Quimera” é descrita como uma canção que “contempla diferentes momentos
nossos sem necessariamente apontar para uma futura sonoridade a ser explorada”.
Isso significa que a banda está em um momento de experimentação livre, ou há um
rumo, mesmo que não definido, para a sonoridade futura da Scalene?

Gustavo: Há um projeto em desenvolvimento aí, ainda não posso revelar, que vai ter uma
sonoridade bem específica, dessas que saltam um pouco da discografia. De certa forma,
uma continuidade do rolê mais Noir / Trip Hop do LABIRINTO, mas com toda uma nova
camada de produção e narrativa bem interessantes. Depois desse ciclo, vejo a gente
tocando juntos em estúdio e compondo um álbum bem cru e rockeiro, nos despirmos um pouco. Vamo vê, muito pode acontecer até lá!

Tomás: A banda está sempre em um momento de experimentação livre. [risos]

TMDQA!: O que mais entusiasma vocês sobre esta “nova fase” da Scalene e o que o
público pode esperar da banda? Podemos dizer que teremos um novo álbum do
grupo vindo em breve?

Gustavo: Como falei acima, acho que o astral entre nós e a forma que organizamos nossa
vida pra que Scalene seja um pouco menos desgastante e mais prazeroso de modo geral,
me anima muito. Começarmos a produzir nossos próprios sons também me interessa
bastante. E depois desse projeto que comentei que está por vir, me anima a ideia de, com
calma – muita calma – entender o que queremos fazer sonoramente. E nessa nova fase tô
curtindo tentar me divertir ao máximo com os fãs na hora do show. A troca tem sido incrível!

Tomás: Devemos adicionar mais alguns shows na agenda, mas nada confirmado ainda.
Sobre futuros lançamentos, aproveitem “Quimera”, nem a gente sabe direito o que vai
acontecer!

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TMDQA!: Pessoal, antes de encerrar, eu tenho o costume de finalizar minhas entrevistas
com essa pergunta: considerando o nome do nosso veículo, vocês acreditam ter
mais discos do que amigos? E se pudessem escolher um álbum para que as
pessoas pudessem conhecer vocês (não necessariamente enquanto artistas), qual
seria?

Tomás: Felizmente ainda tenho mais amigos do que discos. Acho que qualquer álbum do Thrice, ali entre Artist In The Ambulance e Major/Minor na discografia, me representaria bem.

Gustavo: Mó trampo ter vinil – só não é mais trampo do que a manutenção das amizades.
No caso, tenho dificuldade com os dois , porém, vivendo uma ótima fase com amigos.
Um disco só é difícil, hein… Vou de Grace do Jeff Buckley.

TMDQA!: Foi um prazer conduzir essa entrevista, e é um prazer ver vocês mais fortalecidos do que nunca. Obrigado pelo papo, e até uma próxima!

Tomás: Agradecemos demais pelo carinho de sempre e obrigado pelo trabalho que fazem
há tanto tempo. Muito importante pros artistas nacionais!

Gustavo: Sempre é um prazer trocar com vocês, de verdade. Muito obrigado pelo carinho
de sempre. Continuem com o belo trabalho!

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Eduardo Ferreira

TMDQA! Entrevista: Scalene e a celebração especial do renascimento


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